Olá, queridos! Como vão?
Por aqui ainda naquele clima triste de fim de Carnaval, recuperando as energias, organizando as bagunças que ficaram, voltando à rotina normal. Mas também lembrando do texto anterior dessa coluna.
Lembrei muito daquela nossa conversa sobre quem nos permitimos ser por conta das máscaras que assumimos no Carnaval, observei o comportamento alheio e, acima de tudo, o meu próprio. O que não seria diferente já que eu gosto, e falo, de autoconhecimento e não sobre a vida alheia.
Enfim, observei bastante toda a festa, alegria, fantasias, comportamentos e os acontecimentos ao meu redor. Fiquei pensando no quanto ainda se julga o outro por como se porta em eventos assim e, consequentemente como nós julgamos a nós mesmos por querer agir, ou ser, como aqueles que estão sendo julgados apenas por sentirem-se livres para serem quem bem entendem.
Será que isso é certo? Medir o outro, e a si mesmo, pelo seu comportamento em momentos de alegria e descontração? Medir o caráter pelo tamanho e pela quantidade de brilho e paetês da roupa? Será que é certo julgar, ou aceitar que nos julguem, por qualquer coisa que façamos enquanto estamos sendo fiéis a nós mesmos?
Confesso que essa palavra sempre me incomodou muito: certo. Fora do contexto das ciências exatas, onde 1+1=2 e um cálculo de engenharia errado pode custar vidas, fora desse contexto, “o certo” não é algo que exista com toda essa força que lhe atribuem.
Quando falamos sobre viver, sobre pessoas, sobre as imprevisibilidades da vida, sobre se conhecer, falamos também sobre tentativa e erro. Tentar, errar e tentar diferente da próxima vez é como aprendemos sobre o mundo e sobre nós. É como alcançamos o mais perto de saber como as coisas funcionam.
Mas entendam, tentar e errar não é o caminho para descobrir “o certo”, até porque ele não existe. O que existe são incontáveis possibilidades de ser, de viver, de fazer, de entender, de existir. A gente não devia perder tanto tempo, e energia, querendo saber o que é “o certo” ou quem está certo.
Ainda mais quando o conceito de certo vier tentar definir, de uma visão geral de mundo, de um olhar de fora, qual seria “o certo” para o nosso próprio mundo. Aquele que tentamos conhecer quando nos aventuramos a olhar para dentro.
Algo que entendi, e hoje tenho como “meu certo”, é que a vida não é sobre quem está certo, porque na verdade ninguém está. O que a gente sabe sobre a gente, por exemplo, é só o que a gente sabe sobre a gente e ponto.
O que o outro pensa sobre nós não determina quem somos. Nem o que o outro pensa, nem muito menos como nos julga. Como que posso, em qualquer momento, dar tanto valor ao que o outro tem como certo sobre mim, se às vezes até eu mesma estou errada sobre mim?
Anos e anos de análise, terapia, auto observação e a pessoa pode se enganar sobre si mesma. Parte por ainda estar aprendendo sobre si. Parte por sermos esses seres em eterna, e constante, mudança, como já dizia Heráclito. (“A única constante é a mudança”, riquíssima de significados essa frase dele).
Quando entendi isso, passou a ser algo até divertido de observar. Não que eu encare com facilidade todas as minhas autodescobertas e mudanças (quem me conhece, sabe), mas afirmo que é divertido porque sinceramente consigo rir de mim mesma (rir, não debochar) quando consigo desapegar daquilo e abraçar a mudança que se operou naquele aspecto.
Então, se nem eu mesma, eu que sou a única pessoa que estarei grudada comigo 100% do tempo por toda minha existência, se nem assim estou certa sobre mim o tempo todo, como que outra pessoa pode estar? Alguém que veja uma parte de mim, como falamos mais acima, no Carnaval, ou em qualquer outra ocasião, como esse alguém pode estar mais certo sobre mim do que eu mesma?
No fim das contas, a vida não é sobre quem está certo. A vida não é sobre quem ganha uma discussão. A vida não é sobre quem se sobressai em um argumento. A vida não é sobre quem perde numa briga, até porque numa briga todo mundo perde, e que isso fique bem claro.
A vida é sobre se entender e tentar fazer o melhor dela com aquele pouco que a gente conseguiu entender naquela semana, com o tantinho a mais que a gente conseguiu compreender no meio do mês seguinte. A vida é sobre brilhar suas próprias cores e deixar que elas te mostrem o seu caminho.
A vida também é sobre se aceitar, se querer bem, não aceitar o julgamento do outro sobre aquilo que você mesmo ainda está tentando descobrir.
E se em algum momento você descobriu algo maravilhoso em você, se em algum momento você deixou de acreditar nas palavras dos outros que te diziam que você não era bom bastante, que te diziam que você não merecia coisas boas. Se algum momento você deixou de acreditar nesses errados julgamentos, eu te peço agora: por favor, não volte mais a acreditar nisso. Se mantenha firme na verdade que você tem sobre si mesmo.
Jamais volte atrás. Não importa quem diga, não importa o que digam. Jamais volte a acreditar numa visão deturpada de alguém que não olha para você com o mesmo amor, com a mesma generosidade, com o mesmo conhecimento de causa que você mesmo.
É certo que não podemos ignorar nossos próprios defeitos, nem esquecer que sempre temos espaço para melhorar. Mas, a gente também não pode ceder aos julgamentos alheios movidos por uma certeza inexistente sobre nós. Somos únicos, cada um de nós, não podemos ser medidos pelo contexto em que vivemos, nem mesmo pelas partes de nós que os outros acreditam conhecer.
Existe um conceito no qual é aceitável representar o todo apenas por uma parte e o nome disso é metonímia. É uma figura de linguagem, uma ferramenta da gramática para auxiliar nossa comunicação. Funciona apenas para linguagem, não para definir pessoas.
Estejamos atentos ao que o mundo usa como régua para nos medir. Não é um momento, um comportamento, uma festa, uma vestimenta, uma fala, que vai determinar, com certeza, quem somos. (Aliás, certeza, outra palavrinha que me incomoda. Mas deixemos para outro texto).
Que a gente se permita viver independente do olhar alheio. Do olhar movido pelo julgamento, às vezes pela raiva, pela inveja, por qualquer sentimento ruim e que possa deturpar o olhar do outro sobre nós.
Não leve em consideração o que dizem para você e que não é verdade. A sua verdade é que sabe a forma como você se olha, é a que importa. E, desde que você se olhe com amor, com acolhimento, com generosidade, esse sim é o olhar que sempre vai estar certo.
Eu sei que é muito mais fácil falar que fazer. Mas, em minha defesa, eu nunca disse a vocês que o caminho de se conhecer, e se fortalecer enquanto isso, era um caminho fácil. Lembro de ter dito que vale muito a pena. Fácil, não foi uma palavra que usei. Porém, é, sim, possível.
Então, seja Carnaval ou não, abra suas asas, solte suas feras, caia na gandaia, porque a vida vale muito a pena ser vivida quando nós nos despimos das máscaras e continuamos a ser quem queríamos enquanto as usávamos.
Até a próxima!