Categoria: 4.3 Cinema

  • Baleia: uma imersão na solidão e a busca pelo amor

    Baleia: uma imersão na solidão e a busca pelo amor

    Sou um degustador de filmes, séries e tudo mais que o audiovisual produz, e tenho um grande prazer de, mais uma vez, em poucas linhas, te levar a conhecer meu ponto de vista sobre um longa metragem que vi essa semana. O filme se chama “The Whale” (A Baleia). Para apresentar essa obra, escolhi os caminhos do amor e da solidão como elementos principais na compreensão do roteiro do filme, nesse caso, do mapa que nos levará às profundezas desses sentimentos.

    “A Baleia” é um drama psicológico americano, com roteiro escrito por Samuel D. Hunter, baseado em sua peça de mesmo nome. Foi dirigida por Darren Aronofsky e estrelado por Brendan Fraser, Sadie Sink, Hong Chau, Samantha Morton e Ty Simpkins. Seu lançamento aconteceu em 2022 no Festival Internacional de Cinema de Veneza e, três meses depois, foi lançado nos Estados Unidos.

    A narrativa se desenrola em um apartamento claustrofóbico, onde Charlie, interpretado de forma magistral por Brendan Fraser, encontra refúgio em uma existência solitária e autodestrutiva. A obesidade, nesse contexto, não é apenas uma condição física, mas uma metáfora para o isolamento e a dor emocional que o personagem carrega.

    A solidão de Charlie é palpável em cada cena. Seus dias se resumem a aulas online, fast food e a esperança de um contato humano genuíno. A relação com sua filha adolescente, Ellie, é marcada por ressentimentos e mágoas não resolvidas, pelo fato dele ter deixado ela e sua mãe para viver um relacionamento homoafetivo. Tudo se intensificou quando seu companheiro se suicidou, deixando o sentimento de vazio o consumir. A busca por conexão se torna a força motriz da história. Através de encontros com personagens que orbitam seu mundo, como a enfermeira Liz e o jovem missionário Thomas, Charlie busca resgatar a humanidade perdida e encontrar um propósito para sua vida.

    É nesse contexto que a importância de viver o amor se revela, pois o amor não se limita à paixão romântica, mas se estende à amizade, à compaixão e ao perdão. A relação de Charlie com Liz, marcada pela gentileza e pelo cuidado, demonstra que o amor pode florescer nos lugares mais inesperados.

    “A Baleia” é um filme que nos confronta com nossas próprias fragilidades e nos convida a refletir sobre a importância dos relacionamentos humanos. A obra, embora dura e realista, nos oferece uma mensagem de esperança, mostrando que mesmo em meio à dor e ao sofrimento, é possível encontrar a redenção e o amor.

    A atuação de Brendan Fraser é simplesmente sensacional, o que lhe rendeu o Oscar de melhor ator. Sua interpretação visceral e emocionante nos leva a uma jornada emocional profunda, fazendo com que nos conectemos com a dor e a esperança de Charlie.

    Apesar do filme se chamar “A Baleia”, não se trata de um título gordofóbico, esse nome está relacionado a uma redação feita por Ellie, filha de Charlie, sobre a obra Moby Dick, de Herman Melville, quando ela tinha oito anos, a qual ele guardava e sempre lia. A leitura dessa redação gerou uma cena forte e emocionante no final do filme.

    Em suma, esta obra é essencial para aqueles que buscam uma reflexão profunda sobre a condição humana e nos convida a valorizar os relacionamentos e a busca pelo amor em todas as suas formas.

  • Festival Internacional de Cinema de Baía Formosa começa nesta sexta-feira (29)

    Festival Internacional de Cinema de Baía Formosa começa nesta sexta-feira (29)

    Nos dias 29 e 30 de novembro, Baía Formosa, no litoral potiguar, se transforma em um epicentro cultural com a 15ª edição do Festival Internacional de Cinema de Baía Formosa (FINC). O evento, que celebra o tema “Música: Ritmos da Vida”, promete reunir arte, cinema e natureza no Arteco Camp, na Fazenda Estrela.

    Com quase 50 filmes em exibição gratuita, o FINC aposta na pluralidade com mostras competitivas, atividades culturais e atrações musicais. Destaque para a Mostra de Curtas de 1 Minuto, que premiará o vencedor com uma viagem ao Festival OFF Câmera, na Polônia. Outras competições incluem a Mostra Pérolas do RN, dedicada a promover a cultura potiguar, e a Mostra Potiguar, que traz produções locais para a Sala Cine Cajueiro, um espaço ao ar livre que estreia nesta edição.

    O festival também será palco de atrações musicais. Na sexta-feira (29), o cantor Divini encerra a programação cultural, enquanto no sábado (30), Diogo das Virgens promete fechar o evento com chave de ouro.

    Entre os convidados de renome estão o jornalista Zeca Camargo, o diretor polonês Andrés Bukowinski e a cineasta Julia Barreto, que exibe seu filme “2000 Nordestes”.

    Programação diversificada

    Além das exibições cinematográficas, o FINC oferece espaço para o público infantil, praça de alimentação e iniciativas de empreendedorismo local. No sábado, o III Concurso de Pipas promete atrair moradores e visitantes para uma tarde de descontração.

    As mostras incluem filmes premiados, produções locais e obras que exaltam a riqueza cultural do Rio Grande do Norte. Destaque para a exibição do documentário “Free Eubrite”, de Felipe Brêtas, e para a retrospectiva do filme vencedor de 2023, “Minhas Raízes”, de Kilma Batista.

    Criado em 2010, o FINC é promovido pela GREMI Film e Dragmor, com apoio do Governo do Rio Grande do Norte e da Prefeitura de Baía Formosa. Consolidado como um dos principais festivais de cinema independente do Brasil, o evento reflete o compromisso com a valorização do audiovisual e da cultura potiguar.

    O público pode conferir a programação completa e vivenciar a fusão entre arte e natureza em um dos cenários mais paradisíacos do estado. O FINC reafirma sua missão de inspirar e conectar pessoas por meio do cinema, transformando Baía Formosa em um palco global para as artes visuais.

    Confira a programação completa:

    29/11 (sexta-feira)

    • Sala Cine Baía
      • 18h30: Mostra Infantil
        • “Meu Nome é Maluum” (2021) – 8 min
        • “Mãtãnãg, a Encantada” (2019) – 14 min
        • “Lagrimar” (2024) – 14 min
      • 19h: Abertura oficial do FINC
      • 20h: Exibição do documentário “Free Eubrite” – Felipe Brêtas (2024) – 19 min
      • 20h30: Mostra Curtas de 1 Minuto
      • 21h: Mostra Pérolas do RN
      • 21h30: Exibição do documentário “2000 Nordestes” – Vincente Amorim e David França Mendes (2001) – 1h10min
      • 22h40: Show de DiVini
    • Sala Cine Cajueiro
      • 19h30: Mostra Curtas Potiguares
        • “Canto de Acauã” – Jaya Pereira (2024) – 23 min
        • “Olho em Perfeito Silêncio Para as Estrelas” – Dynho Silva (2023) – 10 min
        • “Desiré” – Catarina Calungueira (2024) – 12 min
      • 20h: Exibição da curta “Nem Todas as Manhãs São Iguais” – Fabi Melo (2022) – 18 min

    30/11 (sábado)

    • 15h30 : III Concurso de Pipas – Arteco Camp
    • Sala Cine Baía
      • 18h30: Retrospectiva do filme vencedor de 2023, “Minhas Raízes” – Kilma Batista
      • 19h: Apresentação da Banda Musical Francisco Magalhães
      • 19h30: Exibição do filme “Yabá” – Rodrigo Sena (2024) – 13 min
      • 20h: Mostra Pérolas do RN
      • 21h: Mostra Curtas de 1 Minuto
      • 21h40: Cerimônia de homenagem aos voluntários
      • 22h: Premiações das mostras
      • 22h30: Espetáculo de Diogo das Virgens
    • Sala Cine Cajueiro
      • 18h30: Mostra Infantil
        • “A Colmeia da Aziza” – Rodrigo França (2024) – 14 min
        • “O Cordel da Vila” – Antônio Gil Leal (2021) – 11 min
        • “Taí, ó. Uma Aventura na Lagoa” – Mauricio Venturi (2014) – 14 min
      • 19h15: Mostra Curtas Potiguares
        • “Objetos no Espelho” – Jair Libânio (2024) – 1min40s
        • “A Cor do Meu Orgulho” – Alexandre Fonseca (2023) – 23 min
        • “Eu Vejo Você” – Karolina Trindade (2024) – 25 min
        • “Com Carinho, Raquel” – Beatriz Chaves e Erick Thierry (2024) – 16 min

  • Cine Árido faz sessão gratuita no cinema do Partage

    Cine Árido faz sessão gratuita no cinema do Partage

    Para coroar a primeira edição presencial, o II Cine Árido preparou um momento muito especial. A Mostra Audiovisual do Semiárido será encerrada na noite desta quinta-feira (21) com uma sessão especial, na sala de cinema do Multicine Mossoró, no Partage Shopping, com o filme “Corisco e Dadá”, do diretor Rosemberg Cariry, com entrada gratuita. A exibição começa às 19h. Classificação: 16 anos.

    O filme será apresentado em versão remasterizada, com imagem em qualidade 4k, garantindo uma nova experiência ao público, vinte e oito anos depois do lançamento da obra, em 1996.

    No filme, o capitão Corisco é um condenado de Deus, cuja missão é lavar com sangue os pecados do mundo. Um dia ele rapta Dadá e suas vidas mudam completamente. Diante da morte de um filho, tomado de fúria, Corisco rompe com Deus e Dadá tenta salvá-lo do abismo do ódio, mas o terrível destino não tarda a chegar. A direção e roteiro é do cineasta Rosemberg Cariry, que estará presente participando de uma conversa com o público ao final da exibição.

    Um clássico do cinema nacional, o filme é protagonizado pelos atores Chico Diaz e Dira Paes, e acumulou seleções e prêmios em festivais como Toronto International Film Festival, Palms Springs International Film Festival, Puerto Rico International Film Festival, Ankara International Film Festival, Festival do Novo Cinema Latinoamericano de La Havana – Cuba (Prêmio Geral e Melhor Montagem), Festival de Cinema Latino e Brasileiro de Gramado (Melhor Ator – Chico Diaz), IV Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá (Melhor filme – Júri Popular, Melhor Ator – Chico Diaz, e Melhor Atriz – Dira Paes), XXIX Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (Melhor Atriz – Dira Paes), Chicago Latino Film Festival – 1997 (Seleção Oficial), e VIII Festival de Cinema Brasileiro de Natal (Melhor Figurino).

    Na mesma noite serão anunciados os filmes vencedores das mostras. O II Cine Árido é uma realização do projeto Vozes do Semiárido, do curso de Jornalismo da UERN, e conta com recursos da Lei Paulo Gustavo, selecionado em edital do Governo do Rio Grande do Norte, através da Secretaria de Cultura e Fundação José Augusto. Apoio: UERN, SESC RN e Grão de Cinema.

  • Amores Solitários: uma jornada de autodescoberta com visuais deslumbrantes

    Amores Solitários: uma jornada de autodescoberta com visuais deslumbrantes

    Esse degustado de filmes, séries e tudo mais que o audiovisual produz, vem te trazer suas impressões sobre mais um belo filme. Dessa vez, sobre uma trama montada, tendo o nascimento do amor como pano de fundo. Você certamente já deve ter se apaixonado por alguém e ficou, de certa forma, sem entender no primeiro momento se estava diante de uma paixão ou de um amor nascendo. Diante de uma situação dessa, eu ou você sabemos exatamente como nos sentimos. De uma hora para outra, num rompante, ficamos completamente atraídos por alguém, que, às vezes, parece estar totalmente fora do nosso mundo, uma pessoa completamente diferente de nós, mas com a qual criamos uma ligação e laços imediatos, e quando menos percebemos estamos ali, amando e querendo, com todas as nossas forças, viver esse amor.


    Será que o amor nasce de um embuste, de uma armadilha, que nela caímos sem querer sair? Bem, não tenho essa resposta, nem acredito que você as tenha.


    Entretanto, sem a pretensão de dar alguma resposta sobre o que falei acima, através dessa pequena introdução, desejo que tenha uma boa leitura e que, por gentileza, assista o filme e tire dele suas próprias conclusões.


    “Amores Solitários” nos convida a uma jornada introspectiva, onde personagens complexos buscam se reconectar consigo mesmos em meio às turbulências da vida. A trama, apesar de simples, é tocante e nos faz refletir sobre as relações humanas, as escolhas que fazemos e o verdadeiro significado da felicidade.


    Laura Dern e Liam Hemsworth entregam atuações sólidas, mas a química entre os dois não explode como esperado. A conexão entre os personagens parece mais uma amizade profunda do que um romance apaixonado, no entanto, suas performances individuais compensam essa falta de explosão, nos permitindo acompanhar de perto suas lutas internas e suas evoluções.


    A direção do filme é impecável, com cenas que nos transportam para paisagens deslumbrantes, criando uma atmosfera poética. A fotografia é outro ponto alto, com cores vibrantes e enquadramentos que realçam a beleza natural dos cenários. A trilha sonora, por sua vez, complementa a narrativa de forma sutil e envolvente, intensificando as emoções dos personagens.


    Apesar de seus visuais incríveis, “Amores Solitários” peca um pouco no desenvolvimento de alguns personagens secundários. A história se concentra majoritariamente em Katherine e Owen, deixando pouco espaço para que os outros personagens se aprofundem. Além disso, o ritmo da narrativa pode parecer um pouco lento em alguns momentos, podendo desagradar aos espectadores que buscam uma trama mais dinâmica. No entanto, “Amores Solitários” é um filme que vale a pena ser assistido, principalmente por aqueles que apreciam dramas românticos com uma pitada de introspecção.


    A mensagem central do filme é a importância de se amar e aceitar a si mesmo antes de buscar o amor em outra pessoa. A jornada de autodescoberta dos personagens é inspiradora e nos convida a refletir sobre nossas próprias vidas.


    Em resumo, “Amores Solitários” é um filme que agrada aos olhos e à alma, por sua beleza fotográfica, sua trilha sonora envolvente e as atuações sólidas dos protagonistas, compensando as pequenas falhas. Se você busca um filme para relaxar e refletir sobre a vida, esse é uma ótima opção, pois o mesmo te promoverá uma experiência cinematográfica agradável.

  • Quincas Berro D’Água, de Sérgio Machado (Brasil, 2010)

    Quincas Berro D’Água, de Sérgio Machado (Brasil, 2010)

    Diretor: Sérgio Machado
    Com: Paulo José (Quincas Berro D’Água), Marieta Severo (Manuela), Mariana Ximenes (Vanda), Vladimir Brichta (Leonardo), Flávio Bauraqui (Pastinha), Irandhir Santos (Cabo Martim), Luís Miranda (Pé de Vento), Frank Menezes (Curió), Othon Bastos (Alonso), Walderez de Barros (Tia Marisa), Mílton Gonçalves (Delegado Morais), Carla Ribas (Otacília), Germano Haiuti (Tio Eduardo), Eurico Brás (Agenor), Angelo Flávio (Zico) e Maria Menezes (Lolita)

    Por um desses acasos instrutivos, assisti Quincas Berro D’água no mesmo fim de semana em que li O Falecido Mattia Pascal, do siciliano Pirandello. Tanto o Quincas de Amado quanto Mattia afirmam no princípio de suas narrativas em primeira pessoa, repletas de monólogos, que morreram duas vezes. Mas o que une seus temas, contudo, é que tiveram duas vidas.

    Quincas, servidor público aborrecido e oprimido por seu ambiente, larga família e círculo social, dedicando-se à boemia soteropolitana; Mattia, tido como morto, segue nova vida por diversos destinos da Europa vitoriana. Ambos percorrerão um longo caminho pra alcançarem lugares distintos, cada qual reconstruindo o significado das relações humanas e da própria existência.

    Li o livro de Jorge Amado em que se baseia o roteiro do filme – A morte e a morte de Quincas Berro D’Água, de 1958 – há tempo suficiente pra que muita cosia me escape. Mas o principal pôde ser resgatado pelo filme de Sérgio Machado (Cidade Baixa e Onde a Terra Acaba). Lá estão os numerosos personagens de Jorge Amado, ricamente compostos, ainda que superficiais e caricatos; a linguagem debochada e sem pruridos; a incrível sensibilidade para o hilário, cercado pela miséria e amargura. Nesse último ponto, o filme possui grande mérito pela fotografia sombria e bela que contrasta com a constante comicidade do enredo, preservando – sem perder o riso – a gravidade que contém o texto e seu significado último.

    Apesar de num primeiro plano ser uma grande festa, Quincas aborda com vigor o tema mais produtivo da grande literatura: a existência e suas realidades. Nosso protagonista abandona a segura e cômoda vida de funcionário por um cotidiano desregrado e temeroso. Nesta escolha, faz sua crítica ao mundo da filha, que confrontada pela realidade em que vivia o pai terá de lidar com sua herança.

    O filme possui uma série de atuações notáveis, destacadamente Paulo José (um morto roubando a cena) e Mariana Ximenes no papel de Vanda, a filha. Muito se tem dito sobre os inegáveis talentos de Paulo José, esse formidável ator. Por isso mesmo quero dar atenção especial a Ximenes. Desde O Invasor, a jovem atriz chama atenção pela qualidade de suas atuações. Consegue ser intensa e eloquente sem os maneirismos recorrentes do cinema nacional, com uma forma de interpretar própria que só vemos nos grandes talentos.

    Quincas, o filme, faz justiça a Quincas, o livro. E mais: lhe presta um favor. Sem atender à sedução de rebuscar ou encher de pompa e “eruditismo” o texto cru – e por vezes mesmo limitado – de Jorge Amado, o filme traz o autor em sua melhor forma, nos limites de seu alcance e com dignidade. Ano após ano, vemos péssimas adaptações virem a público, acumulando um grande lixo cinematográfico.

    Felizmente, temos neste filme uma notável exceção. Quincas e Mattia partem de um mesmo sentimento de clausura para chegar a pontos distintos em sua trajetória. A aceitação debochada do próprio fim não deixa de ser um desesperado cinismo de Quincas, e o filme é feliz em deixar esta noção transparecer. Por isso e muito mais, Quincas não só vale ser visto como é provavelmente a melhor adaptação do cinema nacional desde Vidas Secas, lado a lado com Lavoura Arcaica. Isso vai soar um sacrilégio aos cinéfilos, mas como adaptação esse filme entrega tudo o que a obra de Jorge Amado oferece.

  • Ilha das Flores: um retrato pungente da fome na sociedade de consumo

    Ilha das Flores: um retrato pungente da fome na sociedade de consumo

    E aí, tudo tranquilo com você? Espero sinceramente que sim. Como vocês sabem, sou um degustador de filmes e séries, na verdade, de tudo que o audiovisual produz. Deixei claro no último texto que não curto apenas filmes de terror, por achar o gênero sem graça, mas irei sim, a pedido do meu amigo Ionaldo (Naldo), escrever depois sobre um filme de terror que dei valor.

    Pense um pouco, você é capaz de lembrar de todos os filmes e séries que já assistiu? Se sim, você lembra quais? Quem estava na tua companhia? Porque eu, além de lembrar de todos, ainda sei com quem estava quando assisti cada um. O primeiro que assisti foi “Atrapalhando a Suate”, filme de 1983, do quarteto Os Trapalhões, composto por: Didi, Dedé, Mussum e Zacarias, exibido no cine Panorama, no bairro das Rocas, cinema que alguns anos depois passou a exibir só filmes pornôs, em seguida virou igreja. 

    Quando vi esse filme, estava com meu saudoso pai, Francisco de Assis Silva (Chimba), da minha mãe Maria do Carmo dos Santos Silva (Carminha) e da minha irmã Claudia Poliana Silva, mas sem sombra de dúvidas a pessoa com quem mais fui ao cinema, foi meu primo Edgar Fonseca (Novinho), somos, inclusive, xarás de apelido.

    Do final dos anos 80 até os anos 2000, assistimos para mais de 60 filmes nos cines Rio Grande, Nordeste, Rio Verde, além dos cinemas no Natal Shopping e Midway. Vi alguns títulos como: Amor Estranho Amor, Superman 4, Robocop e Capitão América. Poderia colocar título por título, porém deixaria a resenha enfadonha.

    Apesar das plataformas de streaming, que sou usuário assíduo, não dispenso ir ao cinema, pois para para mim é um ritual assistir um filme na grande telona, acompanhando de uma pipoca quentinha.

    O curta-metragem que vou abordar nas próximas linhas traz um tema forte, que precisa ser enfrentado com responsabilidade social por toda sociedade para ser vencido. Esse tema é a fome, flagelo que quem passa por ele perde um pouco da própria humanidade. 

    O curta-metragem é: Ilha das Flores, dirigido por Jorge Furtado em 1989. Esse curta traça um panorama inquietante da fome em meio à abundância, tecendo uma crítica mordaz à sociedade de consumo. A narrativa acompanha o tomate desde sua colheita em uma próspera plantação, simbolizando a capacidade da terra de prover alimento para todos. No entanto, o tomate logo se vê em meio a uma cadeia de exploração e desperdício. Transportado para um supermercado, ele é exposto como um produto comercial, sujeito às leis de mercado e à obsolescência programada. Imperfeito e fora dos padrões estéticos artificiais impostos pelo sistema, o tomate é descartado, mesmo que ainda comestível.

    Sua trajetória o leva ao aterro sanitário da Ilha das Flores, um microcosmo das disparidades sociais. Lá, o tomate se torna alimento para porcos, enquanto crianças em situação de pobreza disputam restos de comida imprópria para o consumo animal. Essa cena brutal expõe a realidade cruel da fome no mundo, mesmo em um país como o Brasil, grande produtor de alimentos.

    Ilha das Flores não se limita a mostrar a fome como um problema individual, mas a desvenda como um sintoma da disfunção sistêmica. A lógica do lucro a qualquer custo, a valorização da estética em detrimento da nutrição e a concentração de renda nas mãos de poucos são alguns dos elementos que contribuem para a perpetuação da fome, mesmo em um mundo que produz comida suficiente para alimentar toda a população.

    O filme se destaca pela sua linguagem simples e direta, utilizando recursos como a ironia e o humor constrangedor para despertar a reflexão crítica do espectador. A trilha sonora minimalista e a narração em tom documental contribuem para a construção de uma atmosfera densa e impactante.

    Ilha das Flores é um convite à reflexão sobre os paradoxos da sociedade de consumo. Mais do que um curta-metragem, é um manifesto contra a fome e o desperdício, um lembrete de que a comida é um direito humano fundamental e que a erradicação da fome é uma responsabilidade coletiva.

    Para além da crítica social, o filme também oferece algumas pistas para a construção de um futuro mais justo e sustentável como: 

    • Combate ao desperdício: reduzir o desperdício de alimentos em todas as etapas da cadeia alimentar, desde a produção até o consumo, é fundamental para garantir o acesso universal à comida.
    • Agricultura familiar: fortalecer a agricultura familiar e campesina que produz alimentos frescos e nutritivos com menor impacto ambiental é crucial para a construção de um sistema alimentar mais justo e sustentável.
    • Políticas públicas: implementar políticas públicas que garantam o acesso à terra, crédito e assistência técnica para os pequenos agricultores, além de programas de distribuição de alimentos para as populações mais vulneráveis, são medidas essenciais para combater a fome.
    • Consciência do consumidor: o consumo consciente, que valoriza produtos locais, frescos e produzidos de forma sustentável é fundamental para pressionar as empresas por práticas mais justas e ambientalmente corretas.

    Ilha das Flores é um filme necessário e atemporal, que nos convida a repensar nossa relação com a comida e nosso papel na construção de um mundo mais justo e sustentável.

    Vale ressaltar que o curta-metragem é de fácil acesso online, o que permite que seja utilizado como ferramenta educativa em escolas, universidades e comunidades. Através da exibição e debate do filme, podemos promover a conscientização sobre a problemática da fome e mobilizar ações para a construção de um futuro com mais justiça alimentar.