O Banco Central (BC) decidiu manter, pela terceira vez consecutiva, a taxa básica de juros (Selic) em 15% ao ano — o maior nível em quase 20 anos. A decisão, tomada por unanimidade pelo Comitê de Política Monetária (Copom) nesta quarta-feira (5), era amplamente esperada pelo mercado financeiro. Segundo o BC, a manutenção reflete um cenário de “elevada incerteza” global e o fato de a inflação brasileira ainda permanecer acima da meta.
Em nota, o Copom afirmou que a estratégia de manter os juros elevados “por um período prolongado” é suficiente para garantir a convergência da inflação à meta de 3%, definida pelo Conselho Monetário Nacional. A autoridade monetária, no entanto, não descartou a possibilidade de novos aumentos caso o contexto interno ou externo se deteriore.
Desde julho, a Selic permanece em 15% — um patamar não visto desde 2006. O ciclo de alta começou em setembro de 2024, quando o BC passou a reagir à persistência inflacionária e às pressões fiscais. Embora o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) tenha acumulado alta de 5,17% em 12 meses até setembro, o IPCA-15 de outubro indicou desaceleração, puxada pela queda dos preços dos alimentos.
Setores produtivos criticam juros altos
A decisão provocou reações imediatas entre empresários e centrais sindicais. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou que a política monetária “excessivamente contracionista” tem sufocado a economia. “A Selic freia o crescimento além do necessário, ameaçando o mercado de trabalho e o bem-estar da população”, afirmou o presidente da entidade, Ricardo Alban.
Pesquisa da CNI aponta que 80% das empresas industriais veem os juros como o principal obstáculo ao crédito de curto prazo. O setor da construção civil também reagiu: segundo o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Renato Correia, o crédito caro tem inviabilizado novos empreendimentos e reduzido a confiança do consumidor.
Críticas sindicais e impactos fiscais
As centrais sindicais reforçaram o coro contra os juros altos. Para a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), cada ponto percentual da Selic eleva em cerca de R$ 50 bilhões os gastos com juros da dívida pública. “É quase R$ 1 trilhão drenado para o rentismo, que poderia financiar saúde e educação”, disse Juvandia Moreira, presidenta da Contraf-CUT.
Já a Força Sindical chamou o cenário de “era dos juros extorsivos”. O presidente da central, Miguel Torres, afirmou que a política do BC compromete o consumo e a renda das famílias.
Mercado defende cautela
Embora reconheça o custo econômico dos juros altos, parte do setor financeiro defende a decisão. Para Ulisses Ruiz de Gamboa, economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), a postura do BC é “coerente com um ambiente de inflação resistente, expansão fiscal e incerteza internacional”.
Enquanto isso, o setor varejista cobra mudanças. A Associação Paulista de Supermercados (APAS) destacou que o Brasil tem hoje “a segunda maior taxa real de juros do mundo”, o que desestimula investimentos e impede a recuperação plena da economia.
Com a Selic em 15%, o Banco Central pretende sinalizar que o combate à inflação segue como prioridade — mesmo que isso custe, no curto prazo, crescimento econômico mais lento e tensões crescentes entre governo, empresários e trabalhadores. Mas será que há relação direta entre os juros estratosféricos e a taxa atual de inflação, num cenário de preços afetados por oscilações globais e de setores ligados a preços administrados? Essa pergunta não tem resposta clara.






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